( aperte o alt ) • Shanti - Edição Nº51
Shanti
Lá, de tão longe, os pensamentos que lhe vinham eram de tudo e de nada.
Pensava nos caminhos que o levaram até ali, nos descaminhos, nos acertos e nos desgostos que, de uma forma ou de outra, desenharam a estrada por onde ele, sem saber, caminharia.
Havia paz, em algum momento. Era, afinal, o que pensava viver quando criança: algo diferente, pessoas diferentes, realidade diferente; assustava-se, no entanto, com o tamanho da diferença que agora lhe acordava todas as manhãs; a voz aguda que repete, como um gravador, a prestação de algum serviço que ele ainda não reconhecia; ou, ainda, o apito estridente que chegava pontualmente às 05h50 para recolher o lixo, com um carrinho de mão, condenando-o a mais um dia de acúmulo, caso o sono não desse trégua.
Havia angústia, é claro, ainda que sem nome ou origem certa. Havia os pensamentos que se sobrepunham e que o deixavam na cama, às vezes por horas, fitando o teto.
Mas estava ali, e estava satisfeito por estar ali.
E, deixados de lado o barulho e a confusão, um novo olhar surgia, apresentando o novo mundo: onde o caos é o diverso, onde as pessoas são cores e movimento, onde o ar se enche de aromas e de música.
Era um início, não tinha dúvidas; e tão diferente de outras vezes, ele, agora, já não se preocupava com o final.