( aperte o alt ) - "Hecatônquiro", Edição Nº14
Hecatônquiro
Ele andava, ainda que não soubesse bem onde.
Na verdade, nem importava muito.
Seguia descalço. Sentia, na sola nua do pé, o chão de terra molhada, gelada. Sentia as pedrinhas, sentia o frio passar por entre os dedos, sentia como se as pequenas poças de água tocassem seus ossos.
Vestia calça jeans, a mesma que usava para trabalhar e para sair. As barras das pernas, um tantinho maiores do que deveriam ser, se arrastavam pelo chão, recolhendo lama. Ele as sentia batendo, pesadas, no calcanhar, e isso aumentava o frio ainda mais.
Tinha o peito nu. O ar era denso, úmido, cobria a pele com gotas minúsculas. Forçava-o a caminhar com olhos semicerrados. Não que desse pra ver muito mais à frente: a névoa, pegajosa, voraz, devorava o horizonte.
Aos lados, fora da trilha, havia algo que parecia grama, e talvez folhas, com aquele amarelo-cobre típico de outono; algumas já muito decompostas, e ele conseguia ver o esqueleto delas.
Percebia, lá na frente, uma sugestão de construção, mas que parecia jamais aproximar-se, por mais que ele caminhasse, e caminhasse, e caminhasse.
Tinha todos os sentidos em alerta, como se tocasse todo mundo, todo o mundo, como se tivesse braços por todo o corpo, como se pudesse olhar para todas as direções.
Era frio, e estranho, e assustador, e maravilhoso.
E ele avançava.
Afinal, havia a tal construção, ou o que assim se insinuava, que permanecia de pé, desafiando-o com seu convite.
vai daqui pra lá, vai por mim
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