( aperte o alt ) - "Galicanto" • Edição Nº24
Galicanto
Desceu do trem, que terminava a viagem com o prazer de quem fazia um favor a um amigo: claro que não era a maneira mais rápida de viajar e nem de longe a mais prática, mas era, isso sim, a mais charmosa, e era assim que queria chegar: na pequena estação, mantida aberta por teimosia da prefeitura, e que hoje tinha no vendedor de bilhetes - um sujeito com a idade do mundo e igualmente teimoso - o retrato do tempo que passou e que também parou, preso entre aquelas paredes.
Trazia apenas a velha mala, dura, antiga, ranzinza, e um sorriso sem tamanho no rosto: respirou fundo, deixando os pulmões se encherem daquele ar frio e úmido da manhã, carregado do perfume de flores que, agora, punham-se a dormir, cobertas pela fina névoa do dia, que mal despertava.
Tirou os sapatos. O velho, usando uma viseira, parecia um quadro esquecido em uma galeria, e olhava-o sem qualquer expressão. Sentia o frio nas solas dos pés e saboreava o leve arrepio que provocava. Avistava, por entre as colunas da estação, a pequena vila com sua dúzia e meia de casas, quase escondidas por árvores de copas imensas e pelo esquecimento das grandes cidades.
Atravessou o pequeno salão, chegou à calçada.
Sorriu para a vila. A vila sorriu de volta.
A rua era, agora, o corredor da sua casa, que o esperava lá na outra ponta, com a luz acesa, com café no fogão, com a saudade ao lado da porta.